Vamos; Faça!
De Rômulo soares Albuquerque
A maneira como ele me olhava, incomodava-me. Pensava: -“ será que esse cara não se toca? É daqueles que se acha… Um rosto bonito, provavelmente ao abrir a boca viria aquelas baboseiras de sempre, previsíveis, patéticas, ridículas de um homem que não respeita sequer a vontade de uma mulher.” E quanto mais o tempo passava mais ele me fitava. Olhava para minha boca, percorria meu corpo, buscava incessantemente meu olhar. Estava sentindo-me agredida. Por vezes pensei em levantar-me; mas essa seria uma atitude covarde, indigna. Ora, basta ignora-lo. Mas porque não conseguia ignora-lo? Começava realmente a me achar covarde. Por que não olhar nos olhos e expressar minha indignação. Pronto, fora isso que resolvi fazer. Procurei incessantemente seus olhos. Pensei encontra-los de pronto. Mas não. Aquilo me angustiou. Se era um jogo, ele sabia jogar com perfeição. Desapercebida peguei-me olhando-o. Seus cabelos escuros, sua pele morena “caliente”, aparentava menos de 30 anos. Sua boca parecia delineada em uma mistura de ousadia e provocação divina. Vestia-se bem, mas não com exageros. Um jeans lavado, entretanto, esse evidenciava um volume másculo, mas sem exibicionismo algum. O sapato não possuía maiores apetrechos; a camisa não mostrava mais do que roupa, entretanto provocava-me desejo insano de percorrer minha mão por seu peito de uma forma que jamais desejei outro tocar.
Seu olhar possuía firmeza encantadora, comecei a me questionar se era para mim que realmente olhava. Esse pensamento começou a incomodar. Não poderia sair dali sem antes ter aqueles lindos olhos dentro dos meus. Eu estava bem arrumada, vestia um vermelho que acentuava a beleza de meus cabelos loiros. Mas dessa vez me faltou a certeza que sempre tive de encantar quem quer que fosse. Não preciso mencionar que inconscientemente já havia balançado meus cabelos, feito poses sensuais buscando atrair sua atenção. Mas, não obtendo resultado, olhei-o fixamente, indiscretamente, de forma invasora. Em fim ele me olhou. Foram os segundos mais longos de minha vida. Enquanto estava em seu olhar, me vi em seus braços, senti o calor de seu respirar, meu corpo estremeceu como jamais antes ocorrera. Seu olhar não me desprezava, mas também não me buscava, nem me desejava como eu queria que desejasse. Era porém terno, doce, meigo, acolhedor. Quando me dei conta faltava-me o ar, fazendo com que não conseguisse segurar suspiro profundo. Se precisasse naquele instante levantar-me, deparar-me-ia com o chão. Subitamente veio um pensamento deixando-me aflita, sem rumo, literalmente sem chão. Aqueles momentos passariam, ele prosseguiria e jamais nos encontraríamos. E como iria esquecer aquela boca, aqueles olhos, aquele jeito único, indescritível e maravilhoso? Precisava, necessitava ouvir sua voz; mas o que eu diria? Diria: “olha; achava-o um babaca buscando possuir-me com os olhos mas… Na verdade era eu quem queria ser possuída por você?” Em meio a esses pensamentos o vi levantar, dirigir-se até mim. Aproximou-se calmamente… Eu estava em transe, querendo tudo, menos ficar sem sua presença. Gentilmente perguntou-me se poderia sentar-se a meu lado.
Sua voz ecoava um canto de doçura. contive-me para não me derreter, acenando com a cabeça em um gesto meio maluco, estava realmente atônita. Senti que estava a me olhar… E como era acolhedor aquele olhar. Estava feliz, nervosa, amedrontada, logo eu que deixava sempre os homens sem saber o que dizer, perdidos, encontrava-me perdida em pensamentos, sonhos e desejos jamais despertados por outrem. Ao invés de proferir qualquer palavra, ousado, tocou minha mão com carinho, com um toque de maciez sublime. Segurou minha mão com maior firmeza. Ela estava trêmula. Porém sua calma, paciência e tranquilidade passou-me paz infinita, despertando-me um fascínio que eu desconhecia. Lentamente soltou minha mão, levando-a a meu queixo, para com um leve toque propiciar com que nos víssemos nos olhos do outro.
Seu rosto expressava um leve sorriso, mais lembrando uma feição cheia de ternura e amor. Para minha surpresa, disse-me que a tempos me observava, imaginando exatamente aquela cena; mas disse não crer existir para mim. Ele prosseguiu, surpreendendo-me ainda mais: — Por vezes imaginei-me abraçando-a quando sozinha chorava… Mas sempre ao me aproximar esboçava uma expressão grosseira, preparada para atacar e ferir; infelizmente não estava pronto para assimilar esse sofrimento. Por vezes quis somente ouvi-la, aperta-la contra meus braços para calar tua dor, intimidando seu choro compulsivo que tanto me fez sofrer. Eu também não tenho mãe, e por vezes pensei que se compartilhássemos juntos essa dor, pudéssemos nos ajudar. Mas você nunca quis assumir seu sofrimento, o que o tornara ainda mais intenso. Eu poderia ter recorrido à força para me aproximar de você, contando-lhe a verdade; mas você, claramente não estava preparada para ouvi-la. Estava sempre fugindo de si mesma a se defender de quem não possuía motivos ou razões para desejar-lhe qualquer mal. Luciana, Lu, você foi por anos o sonho que eu quis sonhar; a boca que quis beijar, a pessoa que meu coração quis por completo entregar. Sempre consegui senti-la, e a máscara que optou por usar somente lhes trouxera mal.
– Eu estava em estado de choque; não conseguia balbuciar uma letra. Ele então olhou para cima, de onde aproximava-se uma mulher. Sim, a mulher que eu até então mais odiei em minha vida estava ali… Mas ao olhá-la, dessa vez estremeci. Pensei está enlouquecendo. Na verdade era eu quem estava ali. Mais velha, com aspecto combalido, franzina, mas sim, era eu eu sim. Em fim me dei conta de se tratar de minha mãe.
Tanta coisa perdi; por tanta coisa sofri; sempre fechada em mim, em meu egoísmo; em minha arrogância. Sim, claro, aquele homem que acusei-o de me olhar com lasciva e querer, olhou-me por toda a vida, mas não o vi, centrada sempre em mim e no mundo fantasioso que ao meu redor criei.
Finalmente muitas verdades afloraram, porém o que me consumia era o fato daquele que tanto me buscou, que tanto me quis está entrando agora em uma igreja a se casar. O homem da minha vida me amou em silêncio, de tudo fizera por mim, e jamais o terei em meus braços. Foi quando ouvi uma voz forte, firme, fazendo-me com que de imediato levantasse o rosto. —O que faz você aqui sentada, garota? Filha, vá! Vá!; lute pelo que você quer, saia dessa eterna posição de vítima da vida e aja. Você sabe o que tem a fazer. Então faça! Vamos; faça!
Parti em disparada; não sei o quanto nem por quanto tempo corri, mas hoje estou aqui em seus braços, confortável, segura e feliz. Ele dorme um sono sereno, tranquilo, e eu rogo a Deus para esses momentos serem eternos.
Autor: Rômulo Soares Albuquerque
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