segunda-feira, 5 de abril de 2010

O DESPERTAR FINAL Por Rômulo Soares Albuquerque

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Ela estava ali. Imóvel, pacientemente acompanhando-me com os olhos.
O silêncio incomodava e angustiava-me.
- Olá.. Como Vai? - Estudava as palavras... Os sentidos... Mas nada conseguia pronunciar
O olhar não era ameaçador... Isso me assustava
Tão acostumado a está pronto a defender-me... Dessa vez não senti iniciativa de nenhum ataque
Pressa era uma palavra que ela desconhecia... Ou vivi segundos como se fossem anos.
Levantei rumo ao banheiro... Ao entrar percebi o espelho quebrado... Não me lembrava disso... Ignorei; seguindo em frente... Com naturalidade pus o pénis para fora, sabendo que ela estava a olhar-me... Pensei que fosse um sonho, pesadelo ou mais uma de minhas alucinações...
Entretanto ela continuava imóvel... Beliscar-me ajudara muito pouco... Estranhamente seu semblante trazia muita paz... Senti vontade de beijá-la... Um frio gelado subiu por minha espinha quando percebi que estava a ler meus pensamentos... Logo os meus, pensei... Tão acostumado a sentir os pensamentos alheios, senti-me vítima... Percebi então como as pessoas eram vulneráveis a mim... Senti na pele a vulnerabilidade de ter os pensamentos expostos.
Mas a intensidade daquele olhar perpetuava-se... Pensei em fitá-lo, ao invés de fingir ignorá-lo. Tudo tão estranho, com tão pouco sentido...
Olhei ao redor, pelos cantos do quarto... Em vários cantos constatei a presença de espelhos refletindo universos diferentes; momentos outrora vividos por mim...
- Não; pare, Rómulo, não tens o direito de agir assim, grosseiro e estúpido... - peguei-me analisando um desses universos... Tudo acontecia em frações de segundos, deixando as sensações internas em conflito intenso e mutáveis...
Outro espelho, nova cena chamou-me a atenção... Tão vaidoso, prepotente, orgulhoso, incapaz de perceber o olhar pueril da garota mais linda e maravilhosa do mundo... Refletiam meus sorrisos, Meus sonhos... O que em mim de melhor existia... Estava muito ocupado centrado em em mim e em minhas atitudes deploráveis.
Destarte sucederam-se momentos onde o mais difícil era errar...Porém o fiz com maestria impecável
Finalmente, dera-me conta novamente da visita ilustre em minha casa...
Então nossos olhares encontraram-se...
Indescritível o que por minha cabeça passara.
Inenarrável o que meu coração sentia..
Estava na hora... Percebi então.... Chegara minha hora de partir
Imediatamente comecei a arrumar minhas coisas.
Dei-me conta de não saber o que levar... Tudo era tão importante, tão valorado exageradamente por mim... Porém agora era indiferente.
E lembrar da lágrima, do ódio, da raiva. Meu Deus, quão pequeno agi, senti..vivi...
Sentei-me então ao seu lado... Verdadeiramente não sabia o que fazer... Que direção tomar...
Não me passou desapercebido os traços lindos que ela possuía.
Tudo lhe era singular...
Só então percebi que estava a persegui-la ; não ela a mim.
Na verdade compreendi que estava morto e necessitei que a morte viesse até mim para descobrir isso
Pior, não queria deixá-la partir... Queria seu abraço... Desfrutar de sua companhia. Está a seu lado....
Levantei e toquei-lhe a face... A pele lembrava a seda mais pura e legítima que um dia...
Desci os dedos aos seus lábios. Senti o calor de sua respiração...
Estava realmente muito atraído... Queria provar de seu gosto... De seu abraço...
Estava enlouquecendo... Deveria está apavorado e não a desejá-la...
Aproximei-me se sua boca e a beijei... Um beijo desconhecido por toda a vida..
Tesão, desejo, querer... Palavras tão minúsculas para descrever o que sentia...
Naquele instante soube que desconheci até então, em vida, o que era o amor...
Acreditava tudo saber. Que a tudo e a todos conhecia quando desconhecia de mim mesmo...
Então ela levantou-se, afastou-se em direção a porta; quando supliquei para que não partisse...
Subitamente o reflexo de um dos espelhos chamou-me a atenção... Nele vi que ela sempre estivera ao meu lado... Sim e, quiçá por isso nunca a tenha percebido...
Tudo fez sentido... Ao olhá-la a vi sorrir...
Hoje, seguro sua mão, despedindo-me e agradecendo-lhe pelos anos que caminhamos lado a lado. Pelos momentos mágicos que vivemos... Pedi que levasse-me junto... Ela não compreendera... Então em prantos abracei-a. Em prantos amei-a pela última vez...
Sempre esperando sua visita vou seguindo sol em sol... Mas ela não...
Quebro o espelho do banheiro... vejo o jorrar do sangue... vejo muita, muita coisa... mas não a vejo...
O vazio imenso; a saudade dolorosa... Na certeza de que a fiz feliz encontro forças... Alento bem-vindo nesses momentos de desespero; sendo essa certeza a única a orgulhar-me... Amei-a por completo... Amei-a sem limites...
A dor sentida mero reflexo do puro e verdadeiro amor... Assim, exatamente inexplicável, sem nenhum sentido, exatamente como sou... Exatamente como sou...

                         Rômulo Soares Albuquerque

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